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Neste capítulo são abordados, por ordem de frequência, os cânceres mais
comuns que ocorrem no período gestacional.
Câncer de mama
O câncer de mama não é frequente durante a gestação. A incidência é de um
caso para 3.000 partos.
O conceito da gravidez associada ao câncer de mama é de nido como câncer de
mama diagnosticado durante a gravidez ou no período de lactação até 12 meses após o
parto. A maioria dos tumores é carcinoma ductal invasivo (80 a 100% dos casos).
Entre 40% e 84% dos tumores têm pior diferenciação, comparado com a mes-
ma faixa etária em mulheres não gestantes. Na gestação ocorrem mais comprome-
timentos linfonodais, tumores de maior tamanho, maior comprometimento vascular
sanguíneo e linfático e 20% deles são carcinomas in amatórios.
A maioria dos estudos demonstra que a gravidez não é um fator de mau
prognóstico, mas assinala doença possivelmente mais agressiva. Os piores resulta-
dos que se observam são devidos ao atraso no diagnóstico e no tratamento e não às
características biológicas dos tumores.
A gravidez subsequente ao câncer de mama parece não comprometer a sobre-
vida da mulher. É aconselhável aguardar dois anos do término do tratamento para nova
gestação. Entretanto, somente 7% das mulheres férteis conseguem engravidar depois
de ter câncer de mama, possivelmente por infertilidade promovida pela quimioterapia
ou pela idade, considerando que este câncer é relativamente raro antes dos 35 anos de
idade, mas acima desta faixa etária sua incidência cresce rápida e progressivamente, e
a fertilidade na mulher diminui.
Diagnóstico
A doença é diagnosticada, em média, quando a gestação tem entre 17 e 25
semanas. As alterações siológicas da mama gravídica (hipertro a e ingurgitamento)
podem contribuir para o atraso no diagnóstico. Os estudos mostram que há atraso
diagnóstico médio de 8,2 meses em relação a não grávidas. Mais de 50% das gestantes
não são diagnosticadas durante a gravidez, apesar dos sinais e sintomas terem apare-
cido durante ou pouco antes da gestação.
Para permitir diagnóstico mais precoce, as gestantes devem ser submetidas
ao exame rotineiro das mamas nas consultas de pré-natal e orientadas a realizar o
autoexame. Qualquer anormalidade encontrada no exame das mamas deve ser sub-
metida à tríade: exame físico, estudo por imagem e estudo histopatológico.
A mamogra a com proteção do abdome pode ser feita durante a gestação com
pouco risco fetal, pois a dose de irradiação para o concepto é calculada em 0,004 Gy. A
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sensibilidade mamográ ca é menor durante a gestação, devido às alterações que ocor- rem nas mamas nesse período. Alguns estudos demonstraram que a ultrassonogra a mamária tem maior sensibilidade na detecção do câncer de mama no período ges- tatório do que a mamogra a, além de ocasionar risco menor ao feto.
A punção por agulha na, durante a gestação, não é bom método, devido à maior frequência de resultados falso-positivos ocasionada pela di culdade de inter- pretação, em decorrência das alterações histológicas da gravidez e da amamentação.
O melhor método para o diagnóstico é a core biópsia, embora haja o risco de ocasionar fístula de leite, além do sangramento aumentado e da infecção. A prevenção dessas ocorrências é feita pela interrupção da amamentação (se for o caso) antes do procedimento, hemostasia rigorosa e uso de antibiótico pro lático.
No estadiamento tomar cuidado com os exames radiativos. O exame de raios-X de tórax, com proteção abdominal, é considerado seguro para o feto. Já a tomogra a computadorizada (TC) do abdome superior e da pelve deve ser evitada durante a gravi- dez. A indicação de ressonância nuclear magnética (RNM) pode ser uma alternativa, em- bora seus efeitos durante os primeiros meses de gestação ainda não sejam conhecidos.
Tratamento
O melhor tratamento para a gestante com câncer de mama é a mastectomia, evitando-se assim a radioterapia. Entretanto, a cirurgia conservadora é possível se a radioterapia (RT) puder ser postergada até o pós-parto.
A pesquisa do linfonodo sentinela, durante a gestação, não deve ser realizada. A aplicação de azul patente não deve ser feita e, quanto ao radioisótopo, não existem publicações su cientes sobre sua segurança.
A radioterapia não é segura durante a gestação. Caso seja necessária, deve ser adiada para o pós-parto. Entretanto, o adiamento por período superior a oito semanas pode comprometer o resultado nal do tratamento.
As indicações de quimioterapia são as mesmas para gestantes não grávidas. Du- rante o primeiro trimestre da gestação há risco de aborto e também de malformações fetais, estimadas em 17%. No segundo e terceiro trimestres o risco de malformações fetais cai para 4%, semelhante às taxas que ocorrem em gestações normais, que são de 3%. Por isso, a quimioterapia, quando indicada, é prescrita nesses trimestres. Durante seu uso a gestante deve ser monitorada para evitar a ocorrência da mielossupressão próxima ao parto, que aumenta o risco de hemorragia e sepse para a mãe e o feto. O ideal é não ministrar quimioterápicos depois da 35a semana de gestação. Mesmo quando usada após o primeiro trimestre da gestação a quimioterapia pode ocasionar trabalho de parto prematuro e baixo peso do nascituro.
Quando houver indicação de tamoxifeno, seu uso deve ser adiado para o período pós-parto. Há evidências de ter efeito teratogênico (defeitos crânio-faciais) em animais.
O uso de terapia-alvo com trastuzumab pode ser considerado no tratamento, pois os cânceres de mama na gestação costumam ter alta positividade para c-erb-2.
No entanto, a expressão do HER-2 também é alta nos tecidos embrionários e há trans- ferência placentária do trastuzumab em animais. Alguns estudos têm demonstrado oligohidrâmnio com o uso dessa droga. Neste sentido, a prudência sugere que essa droga deva ser reservada para uso no pós-parto.
Antigamente, o câncer de mama durante a gravidez era relacionado a prognós- tico pior. Por isso, pensava-se que a interrupção da gestação poderia melhorar o re- sultado terapêutico, o que não foi comprovado. Isso não ocorre com os tratamentos atuais. Portanto, não se cogita o aborto terapêutico no tratamento.
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